Domingo,
18 de dezembro de 2022.
A
conquista da última Copa América, no Brasil, encerrando um jejum de
28 anos sem títulos oficiais, devolveu à Argentina o prazer de
celebrar. A vitória sobre a Itália na Finalíssima, duelo entre os
campeões sul-americano e europeu, mostrou que os hermanos queriam
mais. Queriam o mundo. E ele veio, após 36 anos de espera e dois
vices dolorosos (1990 e 2014). Neste domingo (18), a equipe
albiceleste derrotou a França por 4 a 2 na disputa de pênaltis,
após empate de 3 a 3 com a bola rolando, no Estádio de Lusail, na
decisão da Copa do Catar, assegurando o tricampeonato mundial.
Campeã
em casa, em 1978, e no México, oito anos depois, a Argentina ergueu
a taça do mundo pela primeira vez longe do continente americano. Em
22 edições, esta é a terceira vez que o feito acontece. As
anteriores foram em 1958 (Suécia) com o Brasil e em 2014 (Brasil)
com a Alemanha.
Assim
como em 1986, o título argentino tem um protagonista destacado. Se
lá atrás, o cara foi Diego Armando Maradona, desta vez, teria de
ser Lionel Messi. Quis o destino que o craque, de 35 anos, na última
Copa da carreira, pudesse, enfim, levantar a taça mais cobiçada do
planeta. Mais que isso, sendo o maestro de uma equipe que jogou, é
claro, pelo país, mas também pelo camisa 10. Além de campeão,
Messi encerrou a competição como vice-artilheiro (com sete gols) e
jogador com mais partidas na história dos Mundiais (26, à frente do
alemão Lothar Matthäus).
O
título coroa uma campanha que, na primeira rodada, parecia
improvável. Apesar de favorita, a Argentina estreou derrotada pela
Arábia Saudita, por 2 a 1, de virada. O tropeço deu fim a uma
sequência de 36 jogos de invencibilidade. A recuperação teve
início com a vitória por 2 a 0 sobre o México. O triunfo para cima
da Polônia, pelo mesmo placar, deu aos hermanos a liderança do
Grupo C. Nas oitavas e nas quartas de final, classificações
sofridas ante Austrália (2 a 1) e Holanda (nos pênaltis, após
empate em 2 a 2 no tempo normal). Na semifinal, a grande atuação da
equipe, no 3 a 0 aplicado na Croácia.
Os
franceses, então atuais campeões, sentiram o gosto amargo do vice
pela segunda vez - a primeira foi em 2006. Perderam a chance de
repetir o Brasil de Pelé e Garrincha, última seleção a vencer
duas Copas seguidas, entre 1958 e 1962. A juventude do elenco dos
Bleus, cheio de nomes abaixo dos 30 anos (21 dos 25 convocados),
entre eles o craque Kylian Mbappé,
mostra, porém, que os europeus permanecerão fortes rumo ao próximo
Mundial, em 2026 (Estados Unidos, Canadá e México). O camisa
10, aliás, marcou três gols na final e acabou a competição no
Catar como artilheiro, com oito gols, chegando a 12 na história do
torneio, mas acabou não sendo suficiente.
Na
França, Didier Deschamps mandou a campo uma formação sem
surpresas, com as voltas do zagueiro Dayot Upamecano e do volante
Adrien Rabiot, recuperados de gripe, em relação ao time que bateu
Marrocos por 2 a 0, na semifinal. Do lado argentino, a expectativa
era que Lionel Scaloni escalasse um time com três zagueiros, para
segurar Mbappé. O treinador, porém, não apenas repetiu a linha de
quatro defensores da vitória sobre a Croácia, como trocou o volante
Leandro Paredes pelo atacante Ángel Di Maria.
A
opção de Scaloni se mostrou acertada. Foi justamente com Di Maria,
aberto pela esquerda, infernizando o lateral Jules Koundé, que a
Argentina tomou conta do primeiro tempo. Aos sete minutos, o atacante
rolou para o volante Rodrigo De Paul soltar a bomba da entrada da
área. A bola desviou no zagueiro Raphael Varane e quase surpreendeu
o goleiro Hugo Lloris. Aos 16, após retomar a bola no meio e tabelar
com Messi pela direita, De Paul chegou à linha de fundo e cruzou
rasteiro para Di Maria chegar batendo, por cima da meta.
A
superioridade argentina se consolidou a partir dos 20 minutos,
novamente com Di Maria. O camisa 11 invadiu a área pela esquerda e
foi derrubado pelo também atacante Ousmana Dembelé. Messi, de
pênalti, deslocou Lloris e abriu o marcador. Aos 35, o meia Alexis
Mac Allister puxou contra-ataque com Messi, que achou Júlian Álvarez
pela direita. O atacante lançou Mac Allister, que entrou na área e
rolou na esquerda para Di Maria, na saída do goleiro francês,
ampliar a vantagem sul-americana e se emocionar na comemoração.
Passados
40 minutos, a França praticamente não tinha passado do meio-campo,
levando Deschamps a mexer duas vezes no time, ainda no primeiro
tempo: Ousmane Dembelé e Olivier Giroud deram lugar aos também
atacantes Marcus Thuram e Randal Kolo Muani, os mesmos que entraram
no jogo contra Marrocos e ajudaram a equipe a sacramentar a
classificação à final. Mesmo assim, os Bleus foram para o
intervalo sem uma única finalização, nem sequer para fora.
Na
volta para o segundo tempo, os argentinos se mantiveram no campo
ofensivo, encurralando os franceses. Aos 13 minutos, Álvarez recebeu
de Di Maria na área, pela esquerda, mas o chute, sem ângulo, foi
salvo por Lloris, no canto direito. No lance seguinte, Di Maria, mais
uma vez, passou como quis por Koundé na área e cruzou rasteiro. A
bola passou por De Paul, mas não por Messi, que driblou Thuram, mas
foi travado por Rabiot na hora certa, já na pequena área.
Somente
aos 22 minutos da etapa final é que a França, enfim, conseguiu
finalizar, após 74 minutos bola rolando (considerando os acréscimos
do primeiro tempo), em cabeçada para fora de Kolo Muani. Aos 25, foi
a vez de Mbappé encontrar brecha para dar o primeiro chute na
partida, por cima. Ainda pouco, é claro, mas sinal de que os
franceses estavam vivos na partida.
Tão
vivos que, em dois minutos, buscaram o empate de forma inacreditável.
Aos 34, quando a torcida argentina já cantava olé nas
arquibancadas, Kolo Muani disparou pela esquerda, entrou na área e
sofreu a carga do zagueiro Nicolás Otamendi. Pênalti claro, que
Mbappé converteu, soltando a bomba no canto direito do goleiro
Emiliano Martínez. Aos 36, o atacante Kingsley Coman desarmou Messi
na direita, avançou e cruzou na medida para Mbappé, que acertou um
lindo chute de primeira. Tudo igual no Lusail.
Em
choque e já sem Di Maria (que deu lugar ao lateral Marcos Acuña) a
Argentina sofreu a blitz de uma França acesa, muito graças às
entradas de Coman e Eduardo Camavinga. Nos acréscimos, aos 47
minutos, o volante (que substituiu o lateral Théo Hernández)
desarmou De Paul na esquerda e lançou Mbappé, que bateu cruzado, de
fora da área, com desvio, por cima. Na sequência, após jogada de
Thuram em cima de Otamendi pela esquerda e passe de Camavinga para
dentro da área, Rabiot chutou rasteiro, livre, para boa defesa de
Martínez, em dois tempos. Três minutos depois, enfim, a resposta
dos hermanos em finalização de Messi, da meia-lua, que Lloris
defendeu de mão trocada.
O
duelo foi à prorrogação, com a França mais inteira fisicamente
que a Argentina. Não que isso, em algum momento, fosse um empecilho
para os hermanos, que conseguiram se reorganizar. Se o primeiro tempo
extra foi de poucas emoções, o segundo teve de sobra. Aos três
minutos, o meia Enzo Fernández lançou o atacante Lautaro Martínez
(que tinha acabado de entrar), que entrou na área pela direita e
bateu. Lloris defendeu, mas Messi, na sobra, mandou para as redes.
A
celebração sul-americana, porém, durou pouco. Aos dez minutos,
Mbappé chutou da entrada da área, pela direita, e a bola explodiu
no braço do lateral Gonzalo Montiel (que estava dentro da área).
Mais um pênalti a favor dos franceses e mais um gol do camisa 10 dos
Bleus, o terceiro dele na final, repetindo o feito do inglês Geoff
Hurst, em 1966, último a marcar três gols em uma decisão. A virada
só não saiu aos 17 minutos, já nos acréscimos, porque Martínez
fez milagre em chute de Kolo Muani.
A
decisão da taça, como em 1994 e 2006, seria nos pênaltis. Craques
da final, Mbappé e Messi abriram a série convertendo as respectivas
cobranças. Na segunda rodada de batidas, Martínez pulou no canto
direito para defender o chute de Coman e o atacante Paulo Dybala, que
entrou na segunda etapa da prorrogação, colocou os argentinos à
frente.
A
pressão em cima dos franceses aumentou quando o volante Aurelie
Tchouaméni, tentando tirar a bola do alcance de Martínez, exagerou
na cobrança e mandou à direita, para fora. Paredes, na sequência,
aumentou a vantagem dos hermanos. Na quarta rodada, Kolo Muani soltou
a bomba no meio do gol para manter os europeus vivos, mas coube a
Montiel (o mesmo que cometera o pênalti na prorrogação) fazer o
gol do título.
Argentina
tricampeã mundial. Em algum lugar do céu, Maradona sorri.