O sucesso da alagoana
Marta nos campos pelo mundo contrasta com a realidade vivida pelo futebol
feminino em Alagoas. Se por um lado a atacante do FC Rosengard, da Suécia, foi
campeã nacional e hoje disputa a Liga dos Campeões europeia da categoria, as
meninas que atuam no Campeonato Alagoano seguem lutando por uma valorização da
modalidade no estado.
A missão, porém, é
árdua. Sem receber salários no esporte, e tendo que correr atrás do próprio
sustento, as jogadoras em Alagoas mal conseguem comparecer aos treinamentos
durante a semana. Muitas, apesar de apaixonadas pelo esporte, preferem não
seguir com o sonho de tentar chegar ao mesmo patamar de Marta. Para aquelas que
persistem, mesmo com dificuldades, ainda há pessoas dispostas a ajudar.
Uma delas é Adeílson
Cassimiro, presidente e também treinador do União Desportiva, time que
atualmente carrega o posto de campeão alagoano feminino. E, mesmo tendo no
currículo outros três títulos, o dirigente reconhece que, na terra de Marta, o
futebol da categoria agoniza. Os motivos
listados por ele são muitos, mas o principal é a falta de investimento na
modalidade.
Cassimiro explica que
os custos, apesar de não serem altos, acabam se tornando “pesados” para os
gestores. Ele conta que, por jogo, gasta cerca de R$ 400,00 entre as passagens
das atletas do União e a compra de equipamentos. Os treinamentos, normalmente
um por semana, são realizados em campos públicos e em horários alternativos,
tendo em vista que as meninas do time precisam se dividir entre o esporte e o
trabalho, que lhes garantem o sustento.
Piora o quadro o fato
de que muitas das atletas do União não moram em Maceió, sede do time. Segundo
Cassemiro, das mais de 40 jogadoras que têm à disposição, são poucas as que
residem na cidade. A maioria vem de municípios do interior, como Arapiraca,
Viçosa, Novo Lino e Maragogi.
- O nosso grande
treino é na disputa das partidas do campeonato. Infelizmente há uma grande
dificuldade em se encontrar horário para treinar, porque as meninas precisam
trabalhar, ou até mesmo frequentar a escola. As nossas atividades normalmente
ocorrem às quartas-feiras à noite, mas tem treino que conta apenas com cinco,
dez jogadoras. Muitas delas moram no interior, e a logística fica complicada.
Elas não ganham salário, jogam mesmo por amor à causa. Para a nossa sorte, o
grupo é grande e muitas delas já se conhecem, o que facilita o entrosamento –
revelou o presidente.
01
“Apoio é pequeno”
“O apoio concedido ao futebol feminino praticamente é
inexistente"!
A. Cassimiro
Veterano no futebol
feminino, Adeílson lembra dos poucos patrocínios que reuniu para a sua equipe
ao longo de uma década. A maioria, fornecia apenas camisas e calções. Fora
isso, a manutenção fica na conta dos organizadores. Apesar de admitir uma
tarefa árdua, ele garantiu que tudo é feito por amor ao esporte e,
principalmente, para o futuro das atletas.
- Não é querendo me
vangloriar, a gente não precisa disso, mas hoje o apoio concedido ao futebol
feminino é praticamente inexistente. São poucos os patrocinadores, e não há
interesse em investir. O União está aí hoje porque o futebol é a minha paixão,
e eu me sinto com a obrigação de ajudar a essas meninas. Não financeiramente,
mas de modo que elas tenham no esporte uma chance na vida e façam boas escolhas
– lamentou.
02
Da Suécia, Marta dá recado.
Campeã da liga sueca
de futebol feminino com o FC Rosengard e atualmente na disputa pela Liga dos
Campeões da Europa da categoria, Marta sabe bem das dificuldades encontradas em
sua terra natal. Apesar de ter saído muito nova de Dois Riachos, interior
alagoano, para o Rio de Janeiro, onde começou sua carreira no Vasco da Gama, em
2000, a atacante afirmou que, mesmo de longe, acompanha triste a desvalorização
da categoria em Alagoas.
- É uma triste
realidade, que infelizmente sai também do ambiente alagoano, e atinge todo o
Brasil. Sinceramente, eu desconheço qualquer investimento no futebol feminino
em Alagoas, seja no âmbito público ou privado, o que é uma pena. Tem que
existir mais apoio do governo, da nossa Federação – opinou a camisa 10 da
seleção brasileira, que ainda fez uma previsão ruim para o esporte em seu
estado.
- Os poucos clubes em
atividade em Alagoas daqui a pouco fecham as portas por não terem condições de
se manter. A gente lamenta muito isso. Falta às autoridades abraçar um pouco
mais a nossa causa – completou a atleta, cinco vezes eleita a melhor jogadora
do mundo.
03
“Cenário não é propício”, diz federação.
João Batista, mesmo na
posição de superintendente de futebol amador da Federação Alagoana de Futebol
(FAF), afirmou não ver um cenário propício para uma possível valorização do
futebol feminino no estado. Segundo ele, “culturalmente” os empresários locais não
enxergam potencial na categoria, e preferem investir em outras áreas.
Ele justificou que a
falta de estrutura dos clubes que atualmente disputam o campeonato estadual da
modalidade e, principalmente, os resultados ruins dos representantes locais em
competições de âmbito nacional desencorajam os investidores.
- O que se pode fazer?
O nosso papel a gente faz, organizamos os campeonatos, promovemos as
competições. Mas não temos responsabilidades sobre os times. Eles precisam ter
a estrutura necessária para participar dos campeonatos. Se não há
investimentos, é porque os empresários não veem possibilidade de retorno. É uma
questão cultural do alagoano, apostar em que dá retorno imediato. O futebol
feminino ainda não tem isso.
Atualmente com cinco
clubes na disputa, o Campeonato Alagoano feminino teve início no último dia 28
de setembro. Além do União, participam o Aliança Desportiva, Sete de Setembro,
Dimensão Saúde e Universal. No Brasileiro deste ano, o estado não teve nenhum
representante.